quinta-feira, 2 de maio de 2013

O desafio da CLT, aos 70 anos

Apesar das emendas que recebeu, a Consolidação das Leis do Trabalho tornou-se anacrônica.
Ao completar 70 anos de vigência, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) enfrenta o desafio de modernizar-se. Ela precisa mudar não para suprimir direitos e proteções dos trabalhadores - como afirmam dirigentes sindicais sempre que tratam do tema -, mas para estender suas regras a milhões de trabalhadores esquecidos por ela e por esses sindicalistas e para adaptar suas normas a um mundo do trabalho cujas características são muito diversas das do tempo em que ela foi concebida. Apesar das emendas que recebeu, a Consolidação das Leis do Trabalho tornou-se anacrônica. A alguns vícios de origem, acrescentou outros, que a tornam excessivamente rígida, tolhendo as relações entre empregados e empregadores e impedindo sua modernização.
Não se trata de ignorar os efeitos benéficos para os trabalhadores que ela já produziu. A CLT cumpriu o papel que lhe atribuiu a ditadura varguista do Estado Novo, quando a colocou em vigor em 1.º de maio de 1943, de proteger os trabalhadores que tinham poucas condições de negociação com os empregadores. É com base na CLT que, bem ou mal, trabalhadores e empregadores vêm conseguindo, na maioria das ocasiões, equilibrar seus interesses, não raro conflitantes.
Criada quando se iniciava a industrialização do Brasil e resultado da combinação de leis da década de 1930, a CLT, no entanto, não acompanhou as transformações da economia brasileira, nem, muito menos, do mundo do trabalho, causadas pelo notável avanço tecnológico das últimas décadas.
Embora a maioria dos trabalhadores ainda mantenha vínculos empregatícios tradicionais, é crescente o número dos que desempenham suas funções de maneira diferenciada, em termos de jornada e local de trabalho, formas de relacionamento com a empresa contratante, regras para apresentação dos resultados do trabalho, o uso ou não de equipamentos fornecidos pela empresa, entre outros. Cresce também o número de profissionais que trabalham de modo diferenciado. São engenheiros, advogados, especialistas em tecnologia de informação, entre outros. Mas essas novas formas de trabalho não estão previstas na legislação.
A exacerbação de algumas das características originais da CLT transformou-a, em certos casos, em elemento perturbador das relações entre trabalhadores e empresas que, na concepção de seus criadores, deveria melhorar. O paternalismo implícito na proteção aos menos capazes de se defender tornou-se a principal característica da legislação trabalhista.
Além de excessivamente detalhista, em seus 922 artigos, a CLT é intervencionista, ao impedir, por exemplo, que patrões e empregados negociem livremente e estabeleçam condições de trabalho que considerem as mais convenientes para as duas partes, mas que não estão previstas em lei.
Dirigentes empresariais e sindicais insistem, com razão, que a negociação coletiva é o caminho mais adequado para escapar da rigidez da legislação e adequá-la às especificidades da atividade empresarial. Mas com frequência aquilo que as duas partes negociaram - como a redução do horário de almoço, com a contrapartida do encerramento mais cedo do expediente - é rejeitado por decisão da Justiça do Trabalho baseada na CLT.
Dos vícios antigos, mantém-se a cobrança do imposto sindical, com outro nome, equivalente a um dia do salário de todo trabalhador registrado. Esse dinheiro é distribuído para sindicatos, federações, confederações e centrais sindicais, que, em sua grande maioria, continuam sendo sustentados apenas com o imposto. Desse modo, essas entidades não precisam se preocupar com os problemas de suas bases.
Talvez o que melhor retrate a necessidade de mudança da CLT seja o fato de que, passados 70 anos de sua criação, ainda existam 18,6 milhões de trabalhadores que não contam com a proteção da lei. Entre os fatores que estimulam a informalidade no mercado de trabalho estão o rigor, o detalhismo e a inadequação das regras da Consolidação das Leis do Trabalho à realidade econômica do País.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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